quinta-feira, 17 de setembro de 2020

Chelsea vs Benfica (2013): Tocar o céu, flutuar nas nuvens e cair no inferno.



Em 1990 vi o Benfica perder uma final europeia, diante do Milan, em plenos Pirinéus. Era uma viagem da escola, e os locais estavam todos pelo Milan (eram adeptos, maioritariamente, do Marselha e estavam ressabiados) tal como os meus colegas adeptos do clube verde e branco. A derrota custou.

23 anos depois, o Benfica voltava a uma final europeia. Eu, que na meia final tinha ido ao êxtase e quase desmaiado no 3º golo do Benfica (Obrigado Tacuara!!!) tinha de estar presente. E tinha de estar presente com os meus. E assim foi.

A logística da viagem não foi fácil e começou com toda a questão de bilhética que acabou por se resolver. A viagem seria um voo de Faro para a Alemanha (Koln/Bonn) na manhã do jogo, onde, com aterragem prevista para as 13:05 locais, levantaríamos um carro alugado no qual seguiríamos para Amsterdam, onde esperávamos chegar cedo, curtir a Fan Zone, assistir ao jogo. Após o jogo, o plano era seguir para a Red Light, preferencialmente para comemorar durante uma hora ou duas, e daí seguir para Bruxelas, no mesmo carro, onde voaríamos de volta para Faro para então regressar a Lisboa.

Esta semana, muitos se recordarão, não podia ter começado pior. Tínhamos ido ao Dragão onde um golo aos 91 nos fez perder o campeonato e havia dúvidas sobre o estado mental da equipa. Mas estávamos prontos para ir à luta.

Perto das 2 da manhã encontrámo-nos então na Luz e seguimos em vários carros rumo ao Algarve, tendo a viagem corrido tranquilamente até Faro onde estacionámos perto do aeroporto e nos encaminhámos para o terminal. Aí começaram os problemas. O voo partiu com um enorme atraso estragando todos os planos para o dia, e assim que aterrámos na Alemanha foi um vê se te avias. No nosso caso eramos 5, fomos levantar o carro, e tivemos direito a um Ford Focus. Eu, com 1,84, era o elemento mais pequeno do grupo de 5. Imaginem o que foi então a viagem de carro para o jogo…

Entretanto chovia na Alemanha, o que tornou o transito caótico até à fronteira com a Alemanha e aumento os atrasos mas perto de duas horas antes da final lá conseguimos chegar à zona envolvente da Amsterdam Arena, onde encontrámos amigos, e puseram a par da presença da Hope Solo na fan zone mas não tive oportunidade de a ver. Uma chapa ou outra, uma cervejinha, e segui para a fila para entrar. Na porta ao meu lado, entrava Toni, o Senhor Benfica. Achei um bom presságio! Já chegava de azar e ia correr bem.


Lá dentro junto-me aos meus, e o nervoso miudinho vai aumentando até ao inicio da partida. Concomitante com o pontapé de saída veio todo um estado sobrenatural. O Benfica apresentava-se altamente descomplexado, a jogar enormidades, e sem qualquer resquício do fim de semana anterior. E os adeptos navegavam. Navegavam num mar de apoio incrível e inimaginável, dominando o apoio numa final europeia como poucas vezes se havia registado. A equipa empolgava o público ao mesmo tempo que o público empolgava a equipa. Nada podia correr mal, certo? Errado. Aos 60’ o Chelsea marca e sai na frente. Mas na verdade pouca coisa mudou pois aos 68 empatámos, pelo inevitável Cardozo, e continuávamos melhor. 10 minutos depois, Garay lesiona-se e entra Jardel. E eis que aos 93, o Chelsea bate um canto, na baliza do outro lado. A bola vai até Ivanovic que escapa ao bloqueio de Enzo e Jardel (o karma de ser quem entrou), e ganha a André Almeida. A bola começa a flutuar e visto do outro lado percorre uma trajetória que pareceu demorar 1 minuto até ir tocar a rede da baliza. O grito de “yeaaaaah” que emergiu à nossa frente foi aterrador. Para lá de aterrador. Explodi, desatei aos pontapés numa cadeira e só duas palavras me vinham à cabeça: “Outra vez? Outra vez?”. Tudo isto era sádico. Demasiado sádico. E conseguiu ser pior. O jogo reata e o Benfica quase marca por Cardozo, que quando está prestes a empurrar para a baliza após uma carambola na área, vê um blue aliviar e garantir o troféu para os Londrinos. A crueldade atingiu níveis jamais vistos, e quando pensávamos que o golo já era terrível, vivemos a experiência de ainda parecer que nos iam dar um gelado e quando íamos a pegar nele, ser-nos retirado. 



O jogo terminou e só quera sair do estádio. E saí com o os 4 do meu carro. Caminhámos até ao carro, e nem houve discussão. Não havia red light, não havia nada. Seguimos diretos para Bruxelas-Charleroi onde íamos apanhar o avião. Não dava para mais nada. Parámos pelo caminho para tentar dormitar durante uma hora, e seguimos. 
No aeroporto descansámos mais um pouco e, entretanto, chegaram os companheiros de voo que tinham alugado outros carros. Desta vez com o voo a horas, regressámos a Faro, e daí para Lisboa.

O meu regresso à Europa 7 anos depois tinha sido duríssimo. Mental e fisicamente duríssimo. Logo quando já sonhávamos com Praga onde se disputaria a Supertaça Europeia. Mas foi esta dureza que fez reavivar um bichinho que me trouxe as fabulosas aventuras que se têm seguido época atrás de época. Sempre com um denominador comum: o Benfica. 


quarta-feira, 16 de setembro de 2020

Barcelona vs Benfica (2006): um mar imenso de vermelho e branco



Manchester, Villareal, Lille, Liverpool com presença no primeiro e no quarto destinos... E agora seguia-se Barcelona. Logo após a odisseia de Liverpool e com uma enorme problemática no que dizia respeito aos bilhetes, a qual, a um preço elevadíssimo, acabou por se resolver.

No fim de semana anterior ao jogo, o Benfica vai ao restelo vencer por 1-2, mas nem todas as notícias são boas. Nuno Gomes, que estava em grande forma nessa época e era o goleador da equipa, é vítima duma bárbara entrada de Sandro Gaúcho e fica KO até final da época. Primeiro contratempo.
Com o jogo a realizar-se a 5 de abril de 2006, arrancámos em duas carrinhas na noite de dia 4, fazendo a maior parte da viagem de noite. Já na manhã de dia 5, em pleno território espanhol, pudemos comprovar a imensa maré vermelha que se dirigia para Barcelona. Centenas e centenas de carros nas estradas de “nuestros hermanos”. O 0-0 da Luz deixava algumas esperanças e a eliminatória em aberto. O pensamento é positivo, mesmo sabendo que do outro lado estão Deco, Eto’o e sobretudo Ronaldinho.
Chegamos a Barcelona e vamos fazer o check-in num apartamento perto das ramblas, onde viríamos a pernoitar. Segue-se, um passeio pelas ramblas e percebemos que os blaugrana não estão muito otimistas. Não atravessam uma fase muito famosa e o otimismo, apesar de tudo não é reinante. Alimentado o estomago, fomos deixar as carrinhas perto do estádio e regressámos ao centro de Barcelona. A plaza de Catalunya estava a abarrotar de gente, e muitos, mas mesmo muitos Benfiquistas.
Perto de 3 horas antes do início do jogo arrancámos de metro para o estádio. Eu e o M., brincando com os catalães, imitávamos os espanhóis com o nosso maravilhoso castelhano “es una lastima!”, imitando a preocupação deles. Saídos do metro, dirigimo-nos até ao estádio e à porta de acesso. Entrámos e subimos intermináveis lanços de escada até chegar ao topo do mundo, perdão, do estádio. O facto de sermos dos primeiros, entre vários milhares, a chegar, permitiu-nos ficar numa zona central e não ser destacados para o topo onde se conseguia ver ainda pior o jogo de subbuteo que ia decorrer (sim, em camp nou, no setor visitante, os jogadores são autênticos bonecos de subbuteo).
Entretanto, enquanto o mar vermelho ia preenchendo o longo setor visitante, os adeptos da casa que ficavam no setor à nossa frente iam aparecendo, equipados de capacetes de mota, em muitos casos, o que me causou alguma estranheza. Claro que mais tarde viria a perceber.
O nosso setor encheu-se, e o jogo arrancou ficando a transbordar um mar de vermelho naquela tira que ia do centro do terreno até ao painel eletrónico situado atrás da baliza...



Nos minutos iniciais, logo aos 5 minutos, penalty para o Barcelona. O árbitro assinala uma mão em tudo idêntica à que Thiago Motta tinha feito na Luz, mas aí tinha passado em branco. Exaltei-me e comecei a dar uso ao meu maravilhoso castelhano, dirigido aos adeptos que se encontravam à minha frente “Hey! Ladrones! En Lisboa han jugado andebol!!!” (Maravilhoso andebol em vez de Balonmano!). A resposta era simples, apontavam para os fones a dizer que não me ouviam. Já outros esclareceram-me e colocaram os capacetes: era uma chuvada de coca cola e de bebidas a voar para cima deles. Afinal fazia sentido.
E mais sentido fez quando Moretto (o próprio!!) defende o penalty de Ronaldinho. Se havia quem ainda tivesse bebidas, acho que nessa altura deixou mesmo de ter. E ainda com o nosso setor em euforia, 13 minutos depois, sofremos o golo de Ronaldinho. Aí complicava, e assim se manteve até ao intervalo.
Arranca a segunda parte e o jogo vira. Sente-se o nervosismo do Barcelona, e dos seus adeptos e o Benfica vai crescendo. Até que Simão vai pela esquerda, pode marcar ou assistir e remata ao lado. Poucos minutos depois algo mais surreal, Karagounis remata de fora da área, Valdez defende com dificuldade para a frente e a bola passa entre 3 jogadores do Benfica que poderiam fazer a recarga, sobrando para um do Barcelona, isto a poucos minutos do fim, em que um empate daria a vantagem na eliminatória. Supremo Karma, no desenvolvimento desse lance, Eto’o acaba por fazer o 2-0 e fechar a eliminatória. Os catalães respiram de alívio. Eu tremo. E com o fim do jogo vacilo. O Manel regista uma foto em que se nota o meu ar triste, mesmo de costas, foto essa desaparecida em combate. A tristeza é grande no final da partida. Todos sabiam que era quase impossível, mas ficámos a centímetros de poder passar.
No final do jogo, o regresso à base perto das ramblas e finalmente tentar dormir em condições depois da viagem na noite da véspera.
No dia seguinte, aproveitámos para passear ainda um bom bocado pelas ruas de Barcelona. Deixámos as carrinhas, já completamente carregadas, num parque de estacionamento algo estreito e fomos passear pela cidade. Pouco antes de partirmos, já junto às carrinhas, um motociclo despista-se e o condutor acaba por ter um dano colateral que ficou para os que lá estiveram. Mas tudo ficou ok.
Durante a tarde lá arrancámos rumo a Lisboa, onde chegámos já no dia 7, tristes, mas a cantar os parabéns ao M.

Manchester United - Benfica (2005): Odisseia no arranque das Low Cost em Portugal

 


Recuemos a 2005. O Benfica acabava de regressar aos títulos e, após o fracasso na pré-eliminatória na época anterior, regressava também à Champions. Encontrávamo-nos ainda numa era onde não era fácil viajar pela Europa. O mundo das Low Costs estava a entrar em Portugal, mas na altura apenas do Porto, Lisboa ainda não era servida. E mesmo os destinos com origem no Porto eram limitados. O que fez com que a solução acabasse por ser simples…

Na véspera do jogo acordámos bem de madrugada, tendo-nos juntado no ponto combinado para recolha do pessoal, e arrancámos rumo ao Porto. Mais de duas horas de viagem, e carro estacionado para irmos apanhar o voo que nos levaria a… Londres.

No voo, tudo OK. Era a primeira vez para muitos numa Low Cost, eu incluído, e o espanto pelo quão apertados os lugares eram não tardou a chegar. Mas nada importava, o importante é que seguíamos rumo a Old Trafford para ver o regresso do Benfica à elite europeia, num dos mais míticos estádios da Europa.

Aterrados em Londres, começava a revelar-se o que não tenho deixado de comprovar ao longo destes 14 anos, desde então, a acompanhar o Benfica no estrangeiro. A solidariedade. No aeroporto em Londres, tínhamos o Fábio, português a morar na capital do Reino Unido que ia acolher mais de uma dezena de desconhecidos na sua casa, e que ainda deu uma ajuda no aluguer de viaturas lá fora, que era também algo de muito novo para todos na altura… E assim foi a minha primeira noite passada em Londres, cidade onde jamais tinha ido. Uma travessia da cidade de carro, até chegarmos a Stockwell, onde ficámos alojados. Quanto ao condutor do nosso carro, por ora recusava-me. Conduzir com o volante à direita, só quando saísse do caos londrino.

E assim foi, na manhã seguinte após a saída de Londres: chegados à autoestrada, assumi o volante, e até Manchester tudo correu de forma tranquila, apesar do intenso transito à entrada da cidade (o qual se viria a repetir na saída, comprovando-se a teoria de que Manchester é maioritariamente azul, o grande contingente do United vem de fora da cidade).

Já em Manchester, a curiosidade pela cidade também não se manifestou, e fomos diretos ao estádio para estacionar. Ponto um e grande memória dessa altura: o vento gélido que soprava, vindo do norte. Até estalava… Carro estacionado, destino estádio, mais propriamente a loja e conhecer todo um mundo novo. A loja era gigante. E tudo era explorado, e bem explorado. Pelo caminho umas belas fotos tiradas em frente à estátua do Sir Matt Bubsy e daí até à Pizza Hut para um almoço prolongado.

Já de barriga cheia, voltámos para a zona periférica do estádio, enquanto assistíamos ao enorme contingente de adeptos do Benfica que ia chegando. Pelo meio o registo dum incidente com um peão Benfiquista, o qual ao invés de fazer o necessário “look right, look left”, fez o inverso e acabou por sofrer as consequências. O que não deixava de chegar era povo Benfiquista, o que prometia um setor visitante de apoio forte….

Portas abertas, pessoal a entrar, e embirração seguinte com os stewards ingleses, que com o habitual rigor queriam que todos ocupassem o lugar dos bilhetes e não admitiam que ninguém estivesse de pé. O que acabou por ser cumprido, no que à segunda parte diz respeito, até ao apito inicial. A partir daí, nada há a fazer. Para nós é sempre “stand up for the Champion”.

O jogo foi equilibrado. Frente a um forte Man United, o Benfica mostrava que era possível, mas já perto do intervalo, na sequência de um livre, a bola desvia na barreira e estava feito o primeiro golo dos ingleses, indo o Benfica com uma desvantagem injusta para o intervalo. Pelo meio recebíamos mensagens de Portugal que afiançavam que na transmissão, o apoio só dava Benfica, e que era mesmo impressionante.  Ao intervalo começavam algumas picardias verbais entre adeptos do Benfica, e os adeptos ingleses que estavam nos camarotes atrás de nós.




Começa a segunda parte, e a tendência de equilíbrio mantinha-se, até que o Benfica conquista um livre na quina direita da área. Dito e feito, dali era o Simão e era meio penalty. Não perdi tempo e virei-me para os tais camarotes tendo avisado os locais, perante o gozo deles, que dali estava feito o empate. Dito e feito. Simão faturou e Van der Sar não teve a mínima hipótese. E quando me aprestava para mostrar aos ingleses quem sabia, dou de caras com os mesmos a aplaudir, desarmando qualquer tentativa de provocação minha. Proseguiu o jogo, o Benfica acreditava, bem como os seus adeptos, mas já perto do final, na sequência de um canto, um ressalto num jogador nosso coloca a bola em Ruud Van Nilsterooy que marcou o golo da vitória inglesa, levando a que o Benfica fosse ingloriamente derrotado neste regresso aos grandes palcos europeus….


Assim sendo, após a habitual espera no final do jogo, foi de forma algo cabisbaixa que saímos do estádio. E antes da despedida da malta de Londres, pois dali iriamos diretos para o aeroporto da capital pois o voo de regresso seria de manhã e a viagem ocuparia larga parte da noite, não deixei de dizer ao Fábio: “Voltamos para Liverpool”. E acabámos mesmo por voltar…

À saída do parque, mais provocações de adeptos ingleses e um inacreditável trânsito até chegar à autoestrada. A partir daí, tudo tranquilo até ao aeroporto, no avião, e finalmente no regresso a Lisboa. Estava assim concluída a terceira tour europeia, e da qual infelizmente, não consigo arranjar qualquer registo fotográfico…